_A decisão de transformar os ministérios da Agricultura e do Meio Ambiente em uma única pasta no governo de Jair Bolsonaro foi duramente criticada pelo Instituto Socioambiental (ISA). “Não se trata de uma fusão, mas da extinção do Ministério do Meio Ambiente como o conhecemos”, diz Adriana Ramos, que coordena o Programa de Políticas e Direitos Socioambientais do ISA. O instituto atua há 24 anos na defesa dos direitos socioambientais resguardados pela Constituição Federal.
A uma semana da definição da eleição presidencial, ao lado de outras 30 entidades que atuam na área ambiental como Observatório do Clima, SOS Mata Atlântica e Greenpeace, o ISA já tinha assinado um manifesto em defesa do Ministério do Meio Ambiente. Na época, a fusão dos ministérios era uma das propostas da campanha do presidente eleito no último domingo.
Em entrevista à GLOBO RURAL, Adriana Ramos mostra preocupação com a subordinação das regulações ambientais a um setor que deve ser também regulado – o rural – e também com as exigências por sustentabilidade que o mundo demanda da produção agropecuária brasileira. Além disso, há preocupação com a falta de propostas sobre aspectos do meio ambiente não relacionados com a produção rural e grande apreensão em relação à autonomia e os direitos dos povos indígenas.
GLOBO RURAL – O que o anúncio da fusão dos ministérios da Agricultura com o do Meio Ambiente pode significar em termos ambientais?
Adriana Ramos – Não se trata de uma fusão, mas da extinção do Ministério do Meio Ambiente como o conhecemos, ou seja, como órgão central do Sistema Nacional de Meio Ambiente, instituído pela lei da Política Nacional de Meio Ambiente, desde 1981.
GR – As demandas ambientais podem ser relegadas a um segundo plano?
Adriana – O papel regulador do Ministério do Meio Ambiente estará subordinado a um dos setores regulados, o que implica conflito de interesse e provável acirramento dos impasses e problemas hoje existentes. As ações de combate a atividades ilegais, como desmatamentos, biopirataria e outros crimes ambientais, poderão ser reduzidas. Além disso, não há propostas de como serão tratadas questões relativas a temas como infraestrutura, energia, conservação da biodiversidade e de ambientes marinhos, resíduos, emissões de gases de efeito estufa por atividades de transporte etc.
GR – Como vocês acreditam que ficará a imagem do país no exterior? Que mensagem estaremos enviando para o mundo?
Adriana – A economia brasileira, em especial o agronegócio, é totalmente conectada com mercados globais, que demandam salvaguardas consistentes relacionadas à sustentabilidade da produção. Retrocessos na agenda ambiental do País podem representar riscos enormes à reputação das empresas e produtores brasileiros, colocando o Brasil na contramão do movimento global de transição para a economia de baixo carbono.
GR – O que a medida pode significar para os povos indígenas ou para as populações vulneráveis que vivem da e nas florestas?
Adriana – Para os povos indígenas e populações tradicionais, significará a subordinação das políticas relacionadas aos seus territórios a um setor que tem assumidamente se colocado contra seus direitos e sua autonomia.
GR – Como pode ficar a promoção dos direitos indígenas diante de um governo eleito que já deu declarações contrárias a esses direitos?
Adriana – A maior parte das declarações já feitas contra os direitos indígenas durante a campanha eleitoral apontam para necessidade de mudanças na Constituição e no ordenamento jurídico brasileiro, portanto, esses debates terão que acontecer no âmbito do Congresso Nacional.
GR – De que maneira o lobby da bancada ruralista pode interferir nessas questões?
Adriana – Como já vem interferindo há alguns anos: colocando a destituição dos direitos indígenas como sua pauta prioritária.
GR – Como o ISA tem visto as ações de violência perpetradas contra indígenas desde o último domingo, quando Jair Bolsonaro, que sempre pregou o armamento do homem rural e o fim das demarcações de terras indígenas, foi eleito?
Adriana – Lamentavelmente a violência no campo contra lideranças indígenas e defensores do meio ambiente já é uma realidade, com o Brasil ocupando o vexatório lugar de campeão mundial de assassinatos de defensores do meio ambiente e dos direitos humanos. As sinalizações públicas de legitimação dessas ações só vão acirrar ainda mais os conflitos e estimular crimes e conflitos no campo e na cidades.
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