A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) defende a continuidade da avaliação toxicológica do glifosato mesmo se ficar comprovado que o herbicida não tem relação com a ocorrência de casos de câncer. Para o órgão do Ministério da Saúde, é necessário analisar outros aspectos que podem levar à adoção de medidas de restrição ao uso do produto na agricultura brasileira.
Em comunicado, a Anvisa afirma que tem adotado a mesma postura da US EPA (Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos), no sentido de aprofundar as discussões. “Afinal, o glifosato é o ingrediente ativo com maior volume de vendas no Brasil e, mesmo que se conclua que ele não é carcinogênico e que não possui qualquer impeditivo de registro segundo a legislação brasileira, é importante avaliar a necessidade de medidas de restrição de uso com base em outros aspectos toxicológicos.”
A nota da Anvisa foi uma resposta a questionamento feito pela reportagem de Globo Rural sobre recente decisão da Justiça Federal, que suspendeu o registro de agrotóxicos à base de glifosato, abamectina e tiram. No dia 3 de agosto, a juíza substituta Luciana Raquel Tolentino de Moura acatou pedido do Ministério Público Federal, sob a alegação de demora na reavaliação toxicológica desses princípios ativos.
A decisão da magistrada é motivo de preocupação para o agronegócio, especialmente os produtores de soja. Pelos menos 90% das lavouras brasileiras são semeadas com grão transgênico tolerante ao glifosato, herbicida utilizado na dessecação da palhada antes da semeadura, e por isso considerado fundamental para viabilizar a técnica do plantio direto.
Lideranças das entidades de produtores alertam para a inviabilidade da próxima safra de soja, caso a suspensão do glifosato permaneça. Alegam que não há substituto para o produto que tenha a mesma eficiência. O próprio ministro da agricultura, Blairo Maggi, chegou a dizer que, diante da situação, só haveria duas alternativas: ou não plantar a safra nova ou desobedecer a ordem judicial.
A ordem da Justiça Federal para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária é priorizar a reavaliação toxicológica dos defensivos até o dia 31 de dezembro. Se não cumprir a determinação, está sujeita a multa diária de R$ 10 mil. O órgão tem que informar também quem será funcionário responsável, que pode sofrer processos civil, administrativo e penal caso não atenda a ordem judicial.
“A Anvisa tomou ciência da decisão judicial e está adotando as providências técnicas e jurídicas necessárias”, informa o comunicado enviado a Globo Rural, sem detalhar quais seriam essas providências.
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No comunicado, a Agência explica que a reavaliação toxicológica do glifosato vem sendo feita desde 2008. Contratada para fazer a análise, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), concluiu que não havia evidências suficientes para relacionar o herbicida com a ocorrência de câncer e, portanto, não indicou a proibição do produto.
“À época, a revisão da nota elaborada pela Fiocruz não foi considerada prioritária pela Anvisa, visto que, ao contrário do que ocorreu com outros ingredientes ativos colocados em reavaliação em 2008, a Fiocruz não indicou sua proibição. Por isso, até 2015 a revisão dessa Nota Técnica ainda não havia sido iniciada pela Anvisa”, diz.
Questionada judicialmente sobre a “demora” na avaliação dos agrotóxicos, a Anvisa responde que o assunto é complexo e, por isso, leva tempo. Não apenas no Brasil, mas em outras partes do mundo. Destaca ainda que, em âmbito internacional, ainda não há um consenso relacionado ao potencial efeito cancerígeno do glifosato. Tanto que a União Europeia, pontua, prorrogou a autorização do uso do defensivo e os Estados Unidos resolveram, há pelo menos dois anos, aprofundar a análise toxicológica.
No Brasil, informa a Anvisa, desde 2017, o glifosato foi incluído entre os princípios ativos monitorados pelo Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA). O órgão acrescenta que, neste momento, está analisando estudos de empresas, relatórios de organismos internacionais, literatura científica e dados oficiais de monitoramento de água e intoxicações exógenas para emitir suas conclusões.
O comunicado enviado à Globo Rural informa também que ainda será feita uma análise sobre o uso domiciliar do herbicida, cuja aplicação também é permitida em jardinagem, "além da necessidade de realização de avaliação de risco ocupacional ao produto, bem como a avaliação de outros aspectos toxicológicos relevantes como mutagenicidade, autismo e imunotoxicidade”.
Na semana passada, um processo na Justiça dos Estados Unidos trouxe um novo elemento para o debate sobre a possível relação entre o uso do glifosato e a ocorrência de câncer. A Monsanto foi condenada a pagar US$ 289 milhões em indenização ao jardineiro Dewayne Lee Johnson, cujo diagnóstico de linfoma Não-Hodgkin foi associado ao uso do herbicida.
Dona da Monsanto, a alemã Bayer afirmou que o veredicto está em desacordo com evidências científicas e conclusões de agentes reguladores em todo o mundo. A empresa informou que irá recorrer.
Ouça também a conversa sobre o assunto no CBN Agronegócios da terça-feira (21/8).
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