Mudanças climáticas, transição agroecológica e juventude na agricultura estão no centro das ações de engajamento deste ano do projeto Bota na mesa – “Diretrizes para a Inclusão da Agricultura Familiar na Cadeia de Alimentos”. Entrando no quarto ano de atuação, o projeto encabeçado pelo Centro de Estudos em Sustentabilidade (FGVces) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em parceria com a Citi e patrocínio da Citi Foundation, busca promover a inclusão da agricultura familiar na cadeia de produção de alimentos e abastecimento de grandes centros urbanos. Os próximos passos do projeto foram apresentados e discutidos na terça-feira (20/02), com agricultores, especialistas dos setores públicos e privados, na sede do FGVces, em São Paulo (SP).
Nos dois primeiros anos de atuação, o projeto buscou entender os desafios, entraves e dificuldades de acesso a determinados mercados para estabelecer estratégias que pudessem apoiar na comercialização dos produtos. Nesse período o Bota na Mesa identificou e acompanhou 14 iniciativas de sucesso encabeçadas agricultores de todas as partes do Brasil por meio de uma chamada pública.
Nesta segunda etapa, o projeto dá visibilidades às questões ambientais e climáticas que impactam na produção da agricultura famíliar. Segundo o você-coordenador do Centro de Estudos em Sustentabilidade (FGVces) da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, Paulo Branco, o conjunto de conversas envolvendo vários atores busca debater a perspectiva das empresas e governo às questões da agricultura familiar.
“Temos outros exemplos muito concretos de projetos como estes, com conjunto de conversas envolvendo vários atores como a nossa aqui, que se desdobrou em práticas empresariais e lá na ponta provocou agente do governo a criar um instrumento de regulação de mercado. Aqui é onde eles [representantes de empresas e governo] vêem essas diretrizes aqui construídas a muitas mãos, contribuindo para lidar com esses desafios”, diz Branco.
De acordo com a diretora técnica da Secretaria Estadual do Meio Ambiente de São Paulo, Araci Kamiyama, existe um protocolo institucionalizado das práticas de transição criado pelo órgão que orientam produtores no processo. “É a institucionalização, enquanto governo, junto à sociedade civil, do reconhecimento dessa dificuldade e do tempo que o produtor precisa, orientar, trazer com ele assistência técnica e rural, de que ele está em processo e possa já começar a acessar novos mercados”.
“Ninguém dorme convencional e no outro dia acorda orgânico. Existe todo um caminho que as vezes você não vai transformar em orgânico, mas apenas adotar boas práticas, que não devem ser chamadas de orgânicas porque deveriam ser o básico de uma produção”, ressalta Araci.
Araci ressalta a importância de o governo reconhecer, além dos dados, a agricultura familiar como um ator responsável pela segurança alimentar e suas especificidades. “Antes mesmo de orgânico e agroecológico, a gente está falando de acesso a alimentos frescos, in natura, mais saudáveis. A agricultura orgânica e agroecológica não é apenas viável em pequena escala, mas em pequena escala ela é obrigatória, senão não é viável e ela se relaciona muito mais direto com os recursos naturais, dependente do meio ambiente”, destaca.
Para Araci, só depois de reconhecer efetivamente isso é que o governo irá agir com políticas públicas priorizando a agricultura família. Além disso, muitos projetos criados pelo governo acabam sendo mal sucedidos ou não ganham escala pela ausência uma elaboração não participativa. “A falta de continuidade de políticas públicas é um problema muito grande, principalmente com a transição de governo. Mas também temos uma dificuldade muito grande, enquanto governo, de fazer o planejamento de uma nova ação ou projeto, de forma participativa e intersetorial”, comenta.
Representando o lado empresarial, o engenheiro agrônomo da Walmart, Thiago Fonseca, citou, como um dos pontos desafiadores, a dificuldade de encontrar novos agricultores ou mesmo manter os que já são fornecedores para compra direta de pequenos produtores da empresa. “Hoje nós temos, no Brasil inteiro, uma gama de mais de 200 produtores cadastrados, muitos de pequeno porte para entregar folhagens, por exemplo. E um dos desafios que a gente sempre encontra é a questão da logística, da distância que o produtor está do centro de compra”, explica.
Na questão de logística e infraestrutura e da juventude na agricultura, Fonseca destaca as dificuldades das cooperativas em se manter ou mesmo da criação de novas para viabilizar a venda dos produtos. Dos 200 fornecedores cadastrados para compra direta pela Walmart, apenas 15 são cooperativas.
Um dos pontos citados por ele, linkando com uma das diretrizes de acesso à alimentação saudável à toda população. “Em termos de orgânico, a gente também tem trabalhado bastante em montar espaços exclusivos para isso e a gente vê outras redes fazendo o mesmo. Somos cobrados pelos consumidores e cada vez mais responsáveis pelos produtos que colocamos nas prateleiras”, comenta. Hoje, na média geral da rede Walmart, apenas 2% a 3% das vendas no Walmart correspondem a produtos orgânicos.
A sucessão da gestão das propriedades rurais da agricultura familiar é outra questão abordada nas diretrizes que o engenheiro agrônomo diz ser uma preocupação no varejo. “Muitas vezes, o filho vai estudar na cidade, a família não tem para quem passar o trabalho e a gente perde um fornecedor”, comenta.
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