Como o Brasil pode aumentar a produção em 40% até 2050? A recomendação da FAO para o país foi o mote de um debate que envolveu as principais lideranças da cadeia de proteína animal em Atibaia (SP). O encontro, promovido pela Trouw Nutrition nesta quinta-feira (10/10) reuniu representantes da piscicultura, pecuária leiteira, avicultura e suinocultura e carne bovina.
Megatendências como mudanças demográficas, urbanização acelerada, deslocamento do poder econômico para países emergentes, aquecimento global, escassez de recursos e avanços tecnológicos são alguns dos fatores que podem interferir na produção, além de problemas recorrentes na produção brasileira como a infraestrutura e a burocracia.
Confira as principais estratégias dos setores.
“A piscicultura é uma atividade nova e desconhecida. Hoje, de cada dois quilos de peixe consumidos, um já vem da aquicultura, de peixes criados em cativeiro. Em 2030 serão 70%. É a aquicultura que vai suprir a necessidade de fornecimento de peixes porque rios e mares estão entrando em colapso”, diz o presidente da Peixe BR, Ricardo Neukirchner.
Nos últimos anos, o setor cresceu muito. A taxa foi de 540% no ciclo 2016/2017. A produção atual, estimada em 2017, foi de 691,7 toneladas e o valor da produção é de R$ 5,4 bilhões.
Apesar dos números substanciais, hoje o Brasil importa cerca de U$ 1 bilhão de pescado.
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Apesar disso, na opinião do presidente da Peixe BR, a piscicultura vai crescer no Brasil ainda mais do que a taxa recomendada pela FAO. “O Brasil tem 14% das reservas de água doce do planeta, a piscicultura não precisa de terras, tem diversidade, precisa ser sustentável e é uma máquina de conversão alimentar”.
Hoje, o setor tem investimentos projetados em fábricas de rações, melhoramento genético e frigoríficos. Para 2050, a estimativa é de que sejam produzidos no Brasil 2 milhões de toneladas de peixe por ano. A maior parte deverá ser de tilápia, a terceira espécie mais consumida no mundo e considerada, por sua conversão alimentar, "o frango dos peixes". Até lá, segundo Ricardo, os brasileiros comerão 6 kg de peixe por indivíduo ao ano, a exportação será forte e o valor da produção será de R$ 25 bilhões.
“Há todo um mercado a ser conquistado. Não existe alternativa para se consumir pescado no mundo se não for através da piscicultura. Alguém no mundo vai fazer. O Brasil tem todas as condições para isso. Diversidade de espécies, diversidade de preços, imagem positiva, facilidade de preparo e produção sustentável."
“Como aumentar a produção em 40%? A resposta é uma só. Temos que ser mais intensivos, utilizar melhor os recursos disponíveis para a humanidade e respeitar os recursos finitos do meio ambiente”, diz Roberto Jank, vice-presidente da Abraleite.
Entre 1974 e 2016, a produção mundial de leite cresceu 374%, para 34 bilhões de litros, segundo a Embrapa. No Brasil o crescimento foi bem menor, 71%, o que equivale a 7 bilhões de litros.
“A produção precisa ser intensiva, não importa o modelo. Assim a pegada de carbono é muito menor. Não precisa ser confinamento.
“O resultado depende de diversas variáveis, cabe a nós decidirmos as prioridades, mas o modelo de produção não é prioritário. Temos 1 milhão de produtores, grande parte em um sistema de baixa produtividade. Precisamos mudar o quadro de como produzir", afirma.
“Não dá pra ser um bom pecuarista se não for um bom agricultor. É preciso entender a necessidade dos sistemas de integração, não é possível dissociar pecuária da agricultura”, disse Roberto, lembrando que hoje uma fazenda produz cerca de 40 mil litros de leite por hectare.
“O melhor investimento com vaca de leite, com pecuária de um modo geral, chama-se bem-estar animal. Preservar a vaca, dar conforto para a vaca, ambientação, tudo isso resulta em eficiência. Sempre que me perguntam qual é o melhor investimento eu digo: bem-estar animal. Investimento é sempre em bem-estar animal.”
Segundo o executivo, hoje o maior custo é o custo de oportunidade. “Precisamos mostrar que o que fazemos é melhor do que outra atividade que poderia estar sendo feita no lugar. Em segundo lugar precisamos intensificar a produção por área. Nós temos um trabalho de ganho de oportunidade fácil de fazer. O Brasil já esteve entre os maiores campeões do consumo de leite. O país tem um futuro magnífico e esses 40% nós tiramos de letra”.
“Somos indiscutivelmente o grande fornecedor de proteína animal do mundo”, disse o presidente da ABPA, Francisco Turra, lembrando que a produção brasileira tem um ótimo status sanitário. “Estamos livres de enfermidades globais. Hoje há peste suína africana no mundo e influenza aviária. Não temos casos como esses”, disse o executivo.
Para Turra, a versatilidade e a qualidade são diferenciais da produção brasileira. “O sistema é inspecionado pelo Mapa e pelos 160 mercados consumidores que acessamos. Temos diversas certificações internacionais e recebemos mais de 1000 missões e visitas privadas todos os anos.”
O executivo projeta que, já em 2025, o consumo de aves vai ser maior que o da carne suína. Vantagens como o custo de produção competitivo, programas de sanidade avícola e suína, além da integração entre os elos da cadeia e tecnologia própria devem assegurar a posição ocupada pelo Brasil.
Entre os entraves, o executivo lembra que hoje o Brasil exporta impostos para os mercados compradores e reclama que, na guerra tributária mundial, o Brasil é o país que mais cobra alíquota de imposto de renda sobre o lucro das empresas, com uma taxa de 34%.
“Hoje o cenário nos deixa perceber uma falência do atual modelo federativo. As entidades têm que passar a exercer um papel diferenciado. O principal problema continua sendo a logística”, disse o presidente da Abiec, Antônio Jorge Camardelli.
O executivo lembrou que o principal entrave para a exportação continua sendo a logística. “Nós fazemos um esforço para exportar pelos portos do Norte e agora estamos na expectativa com a possibilidade de abertura de vários países da América. O problema é que , no Brasil, o tempo médio gasto com burocracia em operações portuárias leva em média 59,7 horas. Desse modo eu não consigo perpetuar a qualidade da carne que é entregue.
“Também precisamos ter o aproveitamento real das estatísticas e informações sobre diagnósticos e doenças. Temos exemplos de Estados que têm bancos de informações que não chegam aos produtores”.
De acordo com Camardelli, o Brasil, maior exportador de carne do mundo, não acessa mercados importantes como Japão, Coreia do Sul, Canadá, irã, Indonésia e Taiwan devido a problemas diplomáticos. “São países que não aceitam a vacinação contra a aftosa mas são signatários da OIE.”
Para consolidar a posição de principal país exportador, segundo o executivo, o ministério das Relações Exteriores precisa voltar a ter uma visão comercial, fortalecer os adidos e promover a fidelização dos mercados. “As embaixadas precisam ter uma visão comercial. Outra necessidade é o conceito de não objeção. Os Estados Unidos trabalham com um modelo de viés diferente. Eles deixam qualquer país produzir o que quiserem, só que checam a qualidade no final”, diz.
“É preciso acabar com o raciocínio de exclusão, ou seja, consertar problemas burocráticos burocratizando outras áreas. Temos que investir em marketing, incutir no ministério e nos inspetores uma visão comercial.
“Ninguém tem carne para oferecer ao mundo. Nós só vamos parar com a imigração se combaterem a fome e o Brasil tem totais condições de mudar isso.”
* O jornalista viajou a convite da Trouw Nutrition.
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