Para o cientista político e professor do Insper, Carlos Melo, o Brasil não vive apenas uma crise na economia. Ainda há outras seis crises dentro dessa pela qual o país está passando e isso requer uma série de mudanças, incluindo o modelo econômico vigente. Essa é a primeira, que se limita ao cenário fiscal, afetando as taxas de juros e o câmbio. "Continuar a debater isso como na década de 1990 é sinal de retrocesso. O próximo governante precisa comprovar um aumento de produtividade, além de promover parcerias públicas, privadas e marcos regulatórios que estimulem o crescimento da União", diz Melo.
A segunda crise é a do "presidencialismo de coalizão". Carlos Melo define assim a estrutura e o mecanismo de funcionamento do sistema político brasileiro, porque conjugamos a eleição direta para o definir o Executivo do presidencialismo e o pacto interpartidos do parlamentarismo. Uma vez que os governantes dependem da “coalizão”, ou seja, acordos entre partidos e distribuição de postos administrativos para formar uma maioria parlamentar. "Nos últimos quatro mandatos, não houve renovação. Precisamos romper a lógica do fisiologismo, caso contrário o próximo presidente também não conseguirá sustentar o governo", enfatiza o cientista político.
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Para Melo, a terceira crise é a do financiamento da política. O uso de empresas que têm relação com o Estado para financiar campanhas desmoralizou a atividade política e resultou em operações como a Lava Jato. "O sistema entrou em colapso devido a robustez de algumas instituições como o Ministério Público e a Polícia Federal", explica.
O cientista político defende que a quarta crise é a "república da meia-entrada", conceito de Marcos Lisboa e Zeina Latif, que define a relação entre Estado e capital no Brasil, uma vez que grupos especiais conseguem obter privilégios e benefícios do governo e enfraquecem a economia. "Defender a meia-entrada acaba preservando o sistema e os grandes custos que pagamos. A exemplo disso, a maior bancada que existe no Congresso Nacional é do funcionalismo", exemplifica Melo.
De acordo com Melo, a quinta crise é a da "judicialização da política", quando os governantes passam a decidir aspectos relevantes do funcionamento político, e da "politização da justiça" em referência aos agentes do Ministério Público levados a assumir posições de cunho político, o que desperta insegurança no Poder Judiciário. “A questão é tão crítica que os 11 ministros do Supremo estão mais em pauta do que os 11 jogadores que formam a seleção brasileira de futebol. Em um país como o Brasil, isso é muito sério”, compara o professor.
Por último, o cientista político destaca que a sexta crise é a de liderança política, pois o sistema é refratário a mudança e as regras do jogo não permitem o ingresso de novos candidatos. “Devido a carência de liderança política, a crise política não consegue encontrar solução para a econômica, o que fragiliza ainda mais o sistema brasileiro. Por isso, fazer uma reforma política deve ser uma prioridade do próximo governo”, conclui.
No entanto, Carlos Melo enfatiza que precisamos diferenciar o que é prioridade do que é urgente. "O urgente é o impacto que aparece logo após as eleições. Porque se passar a esperança de que é possível melhorar alguma coisa, aí nós temos chance de melhorar significativamente. O choque de credibilidade talvez fortaleça o próximo presidente a negociar a partir de uma perspectiva menos fisiológica e mais programática, que possa realmente mudar o futuro do Brasil", explica o cientista político.
O cientista político avalia que o maior desafio é combater o desalento do eleitorado e cobrar da próxima liderança política a capacidade de mudar as regras do jogo, o relacionamento entre os poderes, e, sobretudo, a forma de comunicação com a sociedade. "O preço que as pessoas que não gostam de política pagam é serem governadas por quem gosta, por isso a sociedade tem que abandonar o corporativismo e incorporar uma nova forma de pensar", ressalta Melo.
Apesar da insegurança em relação ao futuro, Murilo Parada, CEO da Louis Dreyfus no Brasil, lembra que tudo depende da perspectiva. "Quando escrita em chinês, a palavra crise é composta por dois caracteres. Um representa perigo e o outro oportunidade", afirma.
Roberto Rodrigues, ex-ministro da Agricultura e coordenador do GVagro, da FGV, também prefere o olhar otimista e enfatiza que com investimento em infraestrutura e logística, o agronegócio pode ser uma oportunidade para o Brasil sair da crise. "Precisamos explorar o potencial do Brasil e fazer do nosso agronegócio campeão do mundo. Afinal, o agro é o nosso Neymar", compara.
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