Criador de gado que investe em tecnologia e também é dono de frigorífico, exportador de gado vivo diretamente para a Turquia e produtor que mantém as tradições de gerações anteriores. Esses foram alguns tipos de pecuaristas identificados nos primeiros dias pelo Rally da Pecuária, maior expedição técnica privada do país que iniciou seu roteiro nesta semana no Rio Grande do Sul. Em dois dias, a equipe que conta com agrônomos e técnicos, entre outros, percorreu mais de 700 quilômetros.
Luiz Roberto Saafeld, 47 anos, abate 2.000 cabeças de gado por mês em seu frigorífico no município de Cristais. A carne do Frigorífico Coqueiro abastece supermercados de bairros e casas de carne no Estado. Uma pequena parte é enviada para uma empresa paulista. “Só tem uma possibilidade de ganhar dinheiro com pecuária no Rio Grande do Sul: produzindo com qualidade. E não dá para sobreviver vendendo para redes de supermercados, que pagam um preço negativo para o pecuarista”, diz Luiz, que começou o negócio com o pai em 1987, época em que abatia cinco cabeças por dia.
Cerca de 30% do gado que entra no frigorífico vêm do segundo negócio de Luiz, a Fazenda Pérola Negra, de 1.000 hectares, que fica às margens da Lagoa dos Patos. “A fazenda é um estoque regulador da minha indústria e me dá tranquilidade para negociar com os outros produtores.” Ele tem 25 fornecedores. Aqueles que entregam bois com mais qualidade de carne e com regularidade recebem um bônus.
A fazenda de Luiz tem 900 hectares de pastos perenes, implantados após dois anos de soja, seguida por adubação anual e aplicação de calcário. Lá é feita recria e engorda de animais machos e castrados de raças como angus, hereford e outras de origem europeia, desde 2001. São criados a pasto cerca de 3.000 a 4.000 bois, sendo terminados em confinamento 2.000 por ano.
O industrial e pecuarista conta que uma visita de 45 dias que fez à Nova Zelândia representou um divisor de águas em seu modo de produção. Lá ele conheceu várias fazendas de gado e aprendeu como usar a tecnologia no pasto para aumentar a produtividade de seu rebanho. “Antes, eu manejava o gado. Agora, eu manejo o pasto e antes ainda, o solo. Tem que entender o pasto como uma lavoura e saber que os animais são apenas uma ferramenta, uma colheitadeira.”
Em 2002, os piquetes da fazenda tinham 10 hectares. Hoje, têm 3,5 hectares separados por cercas eletrificadas. O pastejo rotacionado é acompanhado de perto, de quadriciclo, pelo capataz da fazenda, Julio Carvalho, ou Julico, um gaúcho de 54 anos que sempre trabalhou em fazendas de gado, mas estava acostumado com o manejo tradicional. Luiz afirma que aliou o conhecimento e o comprometimento de Julico com as novas tecnologias para elevar ano a ano a produtividade da fazenda. Atualmente, o ganho de peso médio dos animais é de 1,1 kg e a produtividade alcança 800 kg por hectare.
José Pedro Crespo é dono da Brasil Beef, empresa que exportou em 2017 cerca de 94 mil bois vivos para a Turquia. Os animais ficam em confinamento durante 40 dias em duas fazendas em Cristal, também chamadas de unidade de pré-embarque, antes de seguirem para o porto de Rio Grande, onde são alojados em navio para a viagem de 16 dias rumo à Turquia.
Os bois chegam às fazendas com 198 kg e saem com 230 kg para serem terminados no exterior. São alimentados com silagem de milho. Antes de serem embarcados, todos são pesados e passam por inspeção de uma comissão turca. “Eles refugam alguns animais. Estão cada vez mais exigentes”, diz Leonardo Garcia Nunes, zootecnista encarregado da produção. Apesar disso, a exportações da empresa vêm crescendo ano a ano: em 2016, foram enviadas 15 mil cabeças e em 2016, 47 mil.
Crespo, da quarta geração de pecuaristas, diz que o gaúcho não tem poder aquisitivo para consumir a carne produzida no Estado e tem que comer a carne vinda de Mato Grosso ou Rondônia. Segundo ele, a exportação de gado vivo tem ajudado e estimula os bons produtores, mas apenas 90 fazendas estão habilitadas para vender animais para a Europa. Além disso, faltam frigoríficos no Rio Grande Sul.
André, também pecuarista e irmão de José Pedro, diz que o produtor gaúcho quer vender terneiro por um preço que remunere a qualidade da carne. “Não dá para receber por um quilo de terneiro angus o mesmo valor que é pago pelo quilo de um nelore. O pecuarista do Rio Grande do Sul tem custo maior, produz carne de mais qualidade, mas tem que produzir muito ou não sobrevive.” Ele diz que um dos principais entraves é o status sanitário do Estado, que é livre de aftosa com vacinação, mas é impedido de vender carne para o mercado de Santa Catarina, que sempre foi comprador tradicional da carne gaúcha. O Estado vizinho está há dez anos livre de aftosa sem vacinação.
O Rally da Pecuária deste ano, em sua oitava edição, vai ter sete etapas até 1 de setembro, percorrendo cerca de 60 mil quilômetros em 11 Estados. A organização é da Athenagro, novo nome da Agroconsult Pecuária. Além das entrevistas com produtores, a equipe do rally realiza eventos com pecuaristas, veterinários, técnicos e profissionais de mercado para debater os cenários e tendências da pecuária e colhe amostras de pastos que serão analisadas para identificar o nível de degradação das pastagens.
Maurício Palma Nogueira, coordenador do rally, diz que estudos já mostraram que o Rio Grande do Sul, devido à genética das raças europeias, é o único lugar do país com vocação para produzir com escala a carne do tipo gourmet, de valor agregado maior, mas está falhando na terminação.
*A jornalista viajou a convite da Athenagro
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