Entre perímetros urbanos, instalações de empresas e cooperativas agropecuárias e lavouras, a BR-277 também passa por uma terra indígena. Na altura do quilômetro 487, já em Nova Laranjeiras, uma placa avisa da área de aldeia, em um trecho margeado por vegetação e barraquinhas onde se espera por algum motorista interessado.
Nessa região, está a Terra Indígena Rio das Cobras. De acordo com o site Terras Indígenas do Brasil, mantido pelo Instituto Socioambiental (ISA), é uma área com 19 mil hectares de mata atlântica, declarada em 1984 e homologada em 1991.
A população é de 3,25 mil indígenas Guarani, Guarani Mbya e Kaingang, dado de 2014. Mas já foi bem menor. Em 1989, o lugar era ocupado por 1,596 mil habitantes.
Em uma busca rápida pelo noticiário sobre a região, boa parte destaca a situação de vulnerabilidade dos indígenas. Mas há também relatos de iniciativas de apoio, como projetos de incentivo ao cultivo e consumo de peixes, realizado pela Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS).
“O projeto busca fomentar o consumo de peixes e incentivar boas práticas de cultivo em viveiros implantados na Terra Indígena, visando contribuir para a inclusão da piscicultura como sistema produtivo”, diz a universidade, em comunicado divulgado no dia 3.
Mas, na rodovia, bastam poucos minutos de observação para perceber que, em meio ao movimento de carros e caminhões, principalmente, é como se os indígenas ali não estivessem. Por isso, talvez, tenha sido tamanha a curiosidade quando o caminhão de reportagem encostou. Enquanto crianças corriam para ver a máquina mais de perto, adultos olhavam desconfiados.
Foi nesse ponto que a reportagem encontrou duas senhoras trabalhando na confecção e venda de instrumentos artesanais feitos de taquara. Cestos, vasos, chapéus coloridos e na cor natural da palha, enfeites e conjuntos de arco e flecha que, segundo elas, é para divertir as crianças.
Uma delas identificou-se como Santa. Disse ter 82 anos e pertencer à etnia Kaingang. Sorridente em alguns momentos, usando um vestido florido, parecia não se incomodar enquanto o fotojornalista Fernando Martinho a retratava exibindo suas habilidades em raspar taquara com uma faca de cozinha e trançar as ripas com as linhas, dentro da barraquinha, atrás do varal onde os produtos estavam expostos.
“Veio fazer foto do índio pra vender?”, questionou a outra senhora, mais séria e com olhar desconfiado para os homens brancos que, de repente, chegaram ali com papel, caneta e máquina fotográfica, perguntando sobre o que faziam.
Ela se identificou como Alzira, também disse ter 82 anos e ser pertencente à etnia Kaingang. À frente da “vitrine”, é ela que tenta convencer os compradores. “Compra, que ajuda”, disse várias vezes.
Usava um vestido amarelo, um dos seus chapéus de palha, chinelos de dedo e um colar com um pingente de Nossa Senhora Aparecida, de quem se diz devota. Contou que estava ali todos os dias, o dia todo, e que vinha da aldeia à pé.
“De tarde, dá fome”, lamentava a idosa de frases curtas e poucas palavras. Nada parecia querer, além de ajuda. Enquanto Globo Rural esteve ali, ninguém parou. A equipe de reportagem partia para não voltar. O caminho ainda era longo e só restou registrar aquela situação.
Bem mais à frente, pouco depois de Guarapuava, os produtos oferecidos à beira da estrada ficam mais diversificados: frutas, hortaliças. Tinha também pinhão, como o que era vendido por João Horst. O pacote com três quilos saía por R$ 20.
“Esse ano deu pouco pinhão. É o ciclo, né? Um ano é bom, outro não”, explica, diante da banca em frente à pequena propriedade rural onde vive. “O pessoal é exigente. Se o pinhão não estiver brilhante, não compra”, lamenta.
Horst conta que resolveu vender o pinhão em frente de casa há quatro anos. Enquanto conversou com a reportagem, três carretas pararam e os motoristas compraram o produto. No pequeno sítio, ele diz ter uma plantação de erva mate, que vende por arroba para ervateiras.
Tudo é para completar a renda. Aos 53 anos, João diz viver da aposentadoria, conseguida por motivo de saúde. “Tenho que tomar 13 comprimidos por dia”, lamenta.
Já na descida da Serra do Mar, próximo de Paranaguá, o Caminhão do Caminhos da Safra encostou em frente a uma borracharia. Não havia problema com os pneus. Mas o local era uma parada segura para a reportagem captar boas imagens da bela paisagem da Mata Atlântica.
Borracheiro há 28 anos, Adenilson Dolla presta o serviço em um pequeno estabelecimento. Simples, mas equipado para atender quem passa pelo ponto. Ele conta que também presta socorro onde o veículo está parado com problema.
Mas o serviço tem sido fraco ultimamente, lamenta. “Com esses pneus sem câmara, só dá problema se estourar mesmo. Pneu sem câmara não fura”, diz ele. Enquanto contava sua história para o Caminhos da Safra, trocava o pneu de uma motocicleta. Tinha câmara de ar.
A borracharia fica em frente a uma pequena propriedade, onde ele diz viver com outros integrantes da família. A casa onde mora fica ao lado do estabelecimento. Próximas, ele aponta as do pai e do irmão, “cada um com a sua casinha”.
Aos poucos, com o dinheiro que dá, está construindo uma nova casa em cima da borracharia. Diz que ele mesmo compra o material e toca a obra. Há quatro anos. “Quando terminar, quero reformar a outra casa e transformar em um restaurante. Se eu tivesse renda fixa, dava para fazer. Como não tenho, tem que ir aos pouquinhos.”
Source: Revista Globo Rural